quinta-feira, 16 de junho de 2011

O que é variação linguística?

Para que possamos compreender o que é a variação linguística, torna-se indispensável a leitura do livro de Marco Bagno “Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística”, que traz ao leitor as bases teóricas que fundamentam os estudos sociolinguísticos, de forma bem simples e de fácil entendimento. O autor problematiza várias questões, fazendo reflexões importantes para o leitor que se interessa pelo tema da variação linguística, principalmente, para os professores que lidam todos os dias com a realidade da sala de aula.



O livro traz o contexto histórico relacionado às origens da Gramática Tradicional e ao nascimento do preconceito linguístico, explicando as diversas contradições que ocorrem entre as variações apresentadas pelo português e a gramática normatizada.



O aspecto mais forte do livro é seu caráter didático, sua preocupação com a sala de aula e com a diversidade que a compõe, servindo de suporte ou base para os professores que pretendem incorporar em suas práticas educativas um ensino emancipatório, que ofereça ao sujeito a liberdade de escolha e mostre para eles o caminho da cidadania.

Após a leitura, levantamos algumas questões que são problematizadas no livro e que servem de ponto de referência para a elaboração de um pensamento crítico com respeito à variação linguística:

• As pessoas que falam português falam da mesma forma em todos os lugares?
• Podem existir várias formas de se falar o mesmo idioma?
• Será que existe apenas uma única forma certa de falar?
• A escrita é um espelho da fala?
• Será que a língua é algo finalizado e completo?
• Será que um livro de Gramática Tradicional contém toda a verdade a respeito da língua?
• Se os seres humanos são heterogêneos, instáveis, sempre em processo de transformação e mudança, então por que as línguas deveriam ser estáveis e homogêneas? (Bagno, 2007,p37)

As discussões em torno da variação linguística são muito interessantes e podem explicar muito sobre a natureza das línguas, seu funcionamento e sobre os processos de mudança linguística (Bagno,2007). Como se sabe, o português apresenta grande variação nas diversas regiões do Brasil, sendo que essa abordagem pode contribuir muito para o entendimento dos significados produzidos pela diversidade sociocultural do povo brasileiro.



Podemos dizer que, sem sombras de dúvidas, a sociedade brasileira é uma das mais diversas do planeta, sendo composta por diferentes etnias, classes sociais, orientação sexual, graus de escolaridade, idades, culturas, opiniões políticas, religiões, entre outros. Será que todos esses diversos que compõem a sociedade brasileira falam o português do mesmo jeito? Certamente não.




A sóciolinguística busca, através de estudos científicos, relacionar a heterogeneidade linguística com a heterogeneidade social. Se a língua é a forma de interação entre as pessoas, então língua e sociedade estão entrelaçadas, influenciando-se mutuamente, uma constituindo a outra.



Muitos estudiosos, dentre eles Sociológos, Antropológos e Psicológos Sociais já estão convencidos de que não é possível estudar “a sociedade sem levar em conta as relações que os indivíduos e os grupos estabelecem entre si por meio da linguagem”. (p.39) (http://www.scielo.br/pdf/rdpsi/v18n1/a08v18n1.pdf )



Bagno explica que a Norma-padrão é o modelo de língua considerada “certa” e a fala correta é considerada como um produto homogêneo, como se fosse um tesouro nacional , intocável, que deve ser protegida e preservada da ruína e da destruição (p.35).



Os linguistas consideram que “normatização da língua não é um processo 'natural', mas sim o resultado de ações humanas conscientes, ditadas por necessidades políticas e culturais, e nas quais impera frequentemente uma ideologia obscurantista, dogmática e autoritária”. ( p.37)



Nesse sentido, podemos pensar na relação entre Variação linguística x Norma-padrão como:



• Variação: “língua em seu estado permanente de transformação, de fluidez, de instabilidade”(Bagno, 2007, p.38).
• Norma-padrão: “Modelo artificial de língua criado justamente para sustentar' neutralizar' os efeitos da variação, para servir de padrão para os comportamentos adequados, corretos e convenientes” (Bagno, 2007, p.38).



Bagno analisa a língua como um produto sociocultural, uma invenção humana e como tal está sujeita as mudanças sócio históricas e culturais, que ocorrem em todas as sociedades. Sendo pois, heterogênea, múltipla, variável, instável, sempre em processos de desconstrução e reconstrução, permitindo que os falantes se interajam (fala e escrita). Dessa forma, a língua é considerada como uma atividade social.



Durante muito tempo, estudiosos lutaram para manter a língua pura. Hoje sabemos, por meios de estudos, que “a variação é essencial à própria natureza da linguagem humana, e sendo assim, dado o tipo de atividade que é a comunicação lingüística, seria a ausência de variação no sistema o que necessitaria ser explicado” (MONTEIRO, 2000, p.57 In Niéri & Tavares). Em outras palavras, podemos afirmar que se a língua é “viva”, é impossível evitar que, para se adaptar à sociedade e cumprir os objetivos da comunicação, ela varie e mude com o passar do tempo. É possível afirmar também que, ainda que os falantes estejam em constante interação, jamais utilizarão a língua da mesma maneira.( Niéri & Tavares,___,p.5 ).



É importante ressaltar que os estudos de Bagno estão de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino da língua portuguesa, que enfatizam a importância do contexto social do aluno, a cultura e também as transformações da língua dentro desse contexto. Entretanto, não defende a eliminação da gramática e sim que os educadores tornem-se cientes de que existem outras possibilidades e que o preconceito linguístico em nada contribui para a formação humana dos alunos.



Não somos contra o ensino da gramática tradicional, apenas percebemos que nossa língua vai bem além de normas e regras gramaticais. Percebemos que ela é fascinante, cheia de segredos,carregada de cultura, que não tem preconceito de cor, de raça, de religião. Ela é flexível, se adequa aos diversos atores que a utilizam para comunicação e interação, permite que a vida prossiga e que nossos desejos e sonhos não se desfaçam na imaginação.

Referências bibliográficas:



BAGNO, Marcos. Nada na Língua é po acaso: por uma pedagogia da variação linguística. São Paulo: Parábola Editorial, 2007.

NIÉRI, Juliana Sanches e TAVARES, Marilze. Reflexões sobre variação lingüística e ensino